quinta-feira, 25 de julho de 2013

COISAS QUE DEVEM SER DITAS

Pela vida fora roçamos muitas almas: umas ressoam na nossa, outras repelimos, outras escapam à nossa atenção.

As que roçam a nossa alma, marcam - independentemente de positiva ou negativamente. E surgem sob as mais variadas identidades: são aquelas de que mais necessitamos, aquelas que mais remexem as nossas existências, aquelas que surgem e ficam durante... o Tempo.

Não interessa se as buscamos por necessidade, ou se elas simplesmente surgem. O que interessa é que ficam, durante um tempo ou muitos tempos, prontas.

Assim descrevo três médicos incríveis que têm marcado presença constante nas nossas vidas (cá de casa). Destaco-os pelo humanismo, pela vigia, pelo coração espaçoso: Dr. Luiz Cortez Pinto (psiquiatria), Dr. Fernando Menezes (pneumologia), Dr. João Calqueiro (cardiologia). São médicos do meu Pai.

Uma relação médico - doente atinge o seu ponto máximo (penso) quando o médico não necessita de documentos para se lembrar... Quando a conversa é fluída e o doente "está em casa" (por assim dizer...). Quando a família do doente sente a atenção, a solidariedade, o interesse genuíno. Quando eu, filha, tenho oportunidade de colocar todas as questões possíveis, sem pressas, sem receios, com imparcial simplicidade...

Estivemos - eu e os meus pais - esta manhã com o Dr. João Calqueiro, numa consulta de 40 minutos, em que só faltaram os cafézinhos e as bolachinhas. E quando o Doutor João percebeu que o meu Pai estava presenta na sala de espera do hospital, atendendo à fragilidade em que o meu Pai já se encontra (e sendo hoje um dia de grande prostração), passou-o à frente de outros doentes menos urgentes.

São coisas que devem ser ditas. São pessoas que nos enchem o coração, que nos fazem Acreditar, que nos fazem querer permanecer neste pedaço de Terra em que o tempo foge.

Agradecer... não chega a palavra para o fazer!



domingo, 21 de julho de 2013

SONHO DE HOJE

“Demente, sonho realidade
Em que busco,
Sem conselho,
O caminho

Impõe-se leve,
O peso, certo
Do desvairo
Em que m’alinho

Sou treva branca
No despertar,
Entrega pura,
Incendiária

Devagar, vou indo
Encontrada
Sem destino,
Lendária.”

Ana Mafalda Lamas


Paulo Ossião

REALIZAÇÃO vs AMBIÇÃO

Temos frequentemente a necessidade de associar ambição a dinheiro, a um desejo e empenho desmedido em alcançar um lugar de topo, de admiração, de liderança, citando a qualidade (ou desqualidade) de se ser ambicioso negativamente.

Dou muitas vezes por mim a fazer uma análise das minhas vontades, dos meus sonhos, das minhas investidas diárias. Dirão que sou uma pessoa sem ambição se vos contar…

O que é que me move? O que é que me faz avançar na vida, mesmo no momento em que a estagnação parece ser a minha única saída e em que as minhas vontades se apresentam como efémeras utopias?

Respondo: a minha vontade!

Eu considero-me uma personalidade do Tipo A. Tudo em mim é urgente, absoluto, pendente de um tempo que se esgota. Eu corro uma maratona diária no intento de chegar “ali”, de me poder ver “lá”, de sentir o chão da “chegada”. Os meus objectivos diários estão sempre além do dia de hoje, embora me esforce constantemente por citar “um dia de cada vez”.

Sou naturalmente insatisfeita, porque não consigo evitar procurar e perceber mais além… Querer mais além… Quero o significado das "coisas"!

Não sou altruísta! Aliás, considero o altruísmo em si uma utopia, uma prova para o alcance do respeito e admiração de outros, uma necessidade de satisfação pessoal – o que acaba por alterar a essência do termo. O que eu quero são “coisas” que me satisfaçam!

Há anos não me analisava. Não conseguia alcançar um consenso acerca de mim. Multiplicavam-se-me as vontades, os desejos, os sonhos, os objectivos e não sabia como colocá-los em curso: “não batia a bota com a perdigota”. Achava eu… Uma vontade não é em si algo alcançável. Uma vontade é uma luta!

O que fazemos nós, diariamente? Eu digo que lutamos. E o senso comum diz-me algo mais: não tenhas medo de falhar! Em cada evento falhado, encontro a força do evento seguinte. E caminho ao longo de todo o processo percebendo que “se eu não chegar lá, terei pelo menos consciência de que tentei…” É continuar! Um pouco mais do mesmo em cada dia, a cada hora, a cada minuto.

Serei então ambiciosa?

Sim! Diferente da ambição que possas imaginar… A minha ambição é fundamentalmente interior. Claro que ela necessita de uma alavanca exterior. Mas a sério… tudo o que é exterior é infinitamente mais fácil. Ou nunca deste conta que é muito mais difícil decidir o que fazer para o jantar do que propriamente fazê-lo (a menos que não tenhas jeitinho nenhum para a cozinha)?

A minha ambição é a minha obstinação! Leva-me ao alcance de um propósito, propositadamente. E nesta linha, quem não é ambicioso?

Sou levada – porque assim quero. São longas caminhadas, porque da minha vida não espero a medianidade. Espero o memorável!

Ambiciosa ou realizada?

A ambição leva-me à realização. A ambição desmesurada porque é uma luta. Mas olha a meios para chegar a fins. Obedece a trâmites. Obedece ao meu espírito. Obedece à minha alma. Obedece ao que está à minha volta. Obedece a quem está à minha volta. É como uma corrida de obstáculos. E a corrida não tem fim!

No dia em que a corrida chegar ao fim, também eu lá terei chegado. Deixar de correr é perder toda uma essência que nos faz perder o curso da vida.


Tenho quase a certeza que não é isso que algum de nós pretende! É uma questão de encontrar o nosso caminho pessoal, de saber fazer a necessária auto crítica, sem a pretensão do “eu é que sei”. Tentativa /erro… mas sabendo ouvir, sentir e amando sempre o que se faz.


quarta-feira, 10 de julho de 2013

LEVE SOPRO DE LIBERDADE



Quais são os limites da existência?

Aqui, habito a vida lenta…
Suaves brisas impelem o correr.
As horas presas,
Em ideias fechadas, turvas, ávidas.
Sondando o amanhã, avanço
Em anseios perdida,
De conjecturas alimentada.

De que serve o jogo da adivinha?
E por sonhar me perco no presente…

Do ontem trago a vida,
A fadiga,
A memória,
O coração,
Em revolto desalinho,
Da insatisfação perfeito camarada,
Travado nas encruzilhadas
Em que a razão se impõe
Levando com ela a quimera.

Porque trago a esperança,
Fechada,
Embrulhada,
Num leve sopro de liberdade,

Sem limites para a existência.

terça-feira, 2 de julho de 2013

FALHAR OU NÃO FALHAR, EIS A QUESTÃO!

Recentemente juntei-me a um grupo de bloggers: pessoas que prestam assistência a familiares doentes, acamados, com necessidades especiais... Caregiving.com 

Tenho lido textos muito úteis, muito inspiradores, que renovam as minhas próprias ideias, que me fazem lembrar o que pensava ter esquecido. Um texto que achei especialmente marcante foi o seguinte, da Denise. Esta é uma tradução.

"Podemos falhar se estamos a tentar?

Certamente que não estamos a tentar falhar.

E mesmo assim, enquanto tentamos, damos de caras com falhanços. Um determinado serviço não valeu o dinheiro. Uma decisão tomada não parece a melhor. Um qualquer recurso não se torna viável. Uma ideia não funcionou. Uma solução causa mais problemas.

Alimentamos-nos de raivas e arrependimentos. Fumegamos em silêncio, ficando entregues a recriminações. Perdemos dinheiro. Gastamos tempo. Esquecemos-nos de aniversários importantes. Comemos Doritos e Oreos ao pequeno-almoço. Faltamos ao compromisso com o exercício físico.

Todos estes falhanços têm um tema comum: de facto estávamos a tentar sentir-nos melhores, estávamos a tentar ganhar, ultrapassar, manter o passo, ser bem sucedidos, amar, ser ouvidos. Todos os falhanços ocorrem enquanto tentamos chegar ao fim do dia.

Por outras palavras, todos os falhanços ocorreram durante o processo de darmos o nosso melhor, sendo corajosos.

Portanto, se não nos empenhámos em falhar, se simplesmente não tentámos ser cobardes, podemos continuar a achar que falhámos? E se damos o nosso melhor desde o momento em que nos levantamos até nos voltarmos a deitar, estaremos a falhar?

O falhanço só acontece quando paramos de tentar. Quando não nos damos a oportunidade de comer cereais e fruta amanhã ao pequeno-almoço, quando não tentamos que a hora de almoço funcione, quando não enviamos os parabéns aos que amamos, quando não nos permitimos usar um serviço diferente, encontrando novos e diferentes recursos, quando não dizemos o que temos a dizer, percebendo que noutros momentos o nosso silêncio é precioso.

Conforme vamos tentando, vamos falhando. Conforme vamos falhando, vamos aprendendo. Conforme vamos aprendendo, vamos fazendo melhor. Conforme vamos fazendo melhor, melhoramos, somos bem sucedidos. E conforme somos bem sucedidos, tornamos-nos uma melhor versão de nós mesmos - pessoas melhores, mais capazes de perdoar, de aceitar.

Portanto, a única maneira de sermos melhores é se tentarmos, sabendo que os falhanços com que nos deparamos ao longo do percurso são as pontes para o sucesso. Faz simplesmente parte da viagem.

Falhar não é de facto o nosso destino final. É antes a forma de começar."


segunda-feira, 1 de julho de 2013

O OLHAR DO MEU PAI

É bom sabermos que pensam em nós, seja porque razão for: é bom!

Hoje andava a navegar pelo Facebook e dei com um post na minha cronologia: uma Amiga que me dava novidades acerca dos avanços na batalha contra a doença de Alzheimer e de Demência Senil.

Deixam-me arrebatada avanços na ciência como o que consta nesta notícia:


O meu Pai tem vindo a definhar, drasticamente de há três anos a esta data. A primeira fase despoletou após a cirurgia cardio-toráxica há já seis anos, na qual o meu Pai recebeu um bypass na válvula da aorta, próteses na mitral e na tricúspide e um CDI (Implante Cardio Desfibribilador). A desorientação após a longa cirurgia – acima de oito horas -, deu origem ao início das visões e ao cimentar definitivo da cegueira.

Daí em diante, lentamente, instalou-se um quadro de demência. Ténue mas preocupante para nós que não compreendíamos os surgimentos, as confusões, as alucinações. Mas foi – faz este mês três anos – que as referidas e tortuosas alucinações se tornaram constantes, inevitáveis, constantes companheiras de todos nós, umas vezes envolvidas em teorias conspiratórias, tornando o meu Pai agressivo, perseguido pelo medo sempre presente no seu olhar.

Nestes últimos tempos as coisas estão fisicamente mais calmas. Os “amigos e inimigos” imaginários tornaram-se menos ameaçadores, embora sempre presentes. Mas o tempo, esse perdeu-se cronologicamente. Hoje estamos em 1940, ontem em 1993, amanhã em 2003, e depois talvez em 1933… Hoje é verão, amanhã inverno, voltamos ao verão e partimos para a primavera… Há tigres na sala, há um navio a passar mesmo ao lado, há “pessoas” sentadas no sofá, as paredes são de vidro… As horas não são horas, porque agora são seis da manhã e a seguir são três, e cinco minutos depois são horas de almoçar.

E os dias são passados a dar atenção aos meus Pais. Porque ela tem Parkinson’s, osteoporose e degenerescência da mácula relacionada com a idade – felizmente que a doença dela estagnou. Não tem avançado. Com as devidas mazelas, ela mantem-se activa: cansada mas activa.

Por todas estas razões, quando chegam notícias de avanços como este, acende-se uma luz na minha cabeça. Mesmo sabendo que de nada valerá já para o meu Pai, a esperança de que outros doentes beneficiarão dos milagres conseguidos por esses seres fantásticos que se entregam à descoberta e ao estudo, deixa-me… calma!

A vida é confusa. O grande desafio é adaptarmo-nos ao que não podemos mudar. Não controlamos tudo. Apenas o que é possível controlar. Mas nesta passagem, temos que guardar o que nos dá força: o bem!